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quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Livro dos Mártires - Parte 45


A liberação do doutor Sands
Este eminente prelado, vice-chanceler de Cambridge, aceitou predicar, com mui poucas horas de aviso, diante do duque e da universidade, a petição do duque de Northumberland, quando este veio a Cambridge em apoio da pretensão de lady Jane Gray. O texto que tomou foi o que se lhe apresentou ao abrir a Bíblia, e não poderia ter escolhido um mais apropriado: os três últimos versículos de Josué. Assim como Deus lhe deu o texto, assim também lhe deu tal ordem e poder de palavra que suscitou as mais vivas emoções em seus ouvintes. O sermão estava a ponto de ser enviado a Londres para ser impresso, quando chegaram notícias de que o duque tinha voltado e que tinha sido proclamada a Rainha Maria.
O duque foi imediatamente arrestado, e o doutor Sands foi obrigado pela universidade a demitir-se de seu cargo. Foi arrestado por ordem da rainha, e quando o senhor Mildmay se perguntou como um homem tão erudito se atrevia a colocar-se voluntariamente em perigo e falar contra uma princesa tão boa como Maria, o doutor respondeu: "Se eu for fazer como fez o senhor Mildmay, não deveria temer nenhum cárcere. Ele veio armado contra a Rainha Maria; antes, um traidor, agora, um grande amigo dela. Não posso eu com a mesma boca assoprar frio e quente deste jeito". Seguiu um saqueio geral das propriedades do doutor Sand, e foi levado logo a Londres montado num pangaré. Teve de suportar muitos insultos pelo caminho, provenientes de católicos fanáticos, e ao passar pela rua de Bishopsgate, caiu no chão por uma pedrada que lhe lançaram. Foi o primeiro prisioneiro a entrar na Torre, naqueles tempos, por motivos religiosos. Lhe permitiram entrar com sua Bíblia, mas lhe tiraram suas camisas e outros artigos.
O dia da coroação de Maria, as portas do cárcere estavam tão mal guardadas que era fácil escapar. Um verdadeiro amigo, o senhor Mitchell, foi vê-lo, lhe deu seus próprios vestidos como disfarce, e se mostrou disposto a permanecer em seu lugar. Este era um exemplo extraordinário de amizade; mas ele recusou a oferta, dizendo-lhe: "Não tenho conhecimento de nenhuma causa pela que deva estar em prisão. Fazer isto me faria duplamente culpado. Esperarei o beneplácito de Deus, mas me considero um grande devedor vosso"; assim se foi o senhor Mitchell.
Com o doutor Sands estava encarcerado o senhor Bradford; foram custodiados no cárcere, estreitamente, durante dezenove semanas. O guardião, John Fowler, era um perverso papista e, contudo, tanto o persuadiram, que no final começou a favorecer o Evangelho, e ficou tão persuadido da verdadeira religião que um domingo, quando celebravam a missa na capela, o doutor Sands ministrou a Comunhão a Bradford e a Fowler. Assim, Fowler deveio filho deles, gerado em prisões. Para fazer lugar a Wyat e seus cúmplices, o doutor Sands e outros nove predicadores foram enviados a Marshalsea.
O guarda de Marshalsea designou um homem para cada predicador, para que o conduzisse pela rua; os fez andar na frente, e ele e o doutor Sands seguiram, conversando juntamente. Para esta época, o papismo começava a ser impopular. Depois de ter passado a ponte, o guarda disse ao doutor Sands: "Vejo que pessoas vãs quiseram lançar-vos ao fogo. Vós sois tão vão como eles se, sendo jovem, vos mantendes em vossa própria arrogância, e preferis vossa opinião à de tantos dignos prelados, ancião, eruditos e sérios homens como há neste reino. Se é assim, vereis que sou um guarda severo, e que meu conhecimento é pequeno; me basta com conhecer a Cristo crucificado, e nada tem aprendido quem não vê a blasfêmia que há no papismo. A Deus me renderei, e não aos homens; nas Escrituras tenho lido acerca de muitos guardas piedosos e corteses: que Deus me faça um deles! E se não, espero que Ele me dê força e paciência para suportar vossos maus-tratos". Depois agregou: "Estais resolvido a manter-vos em vossa religião?". "Sim", disse o doutor, "pela graça de Deus!". "A verdade", disse o guarda, "gosto de você tanto mais por isto; somente vos provava, contai com todo favor de que possa fazer-vos objeto; e me considerarei feliz se posso morrer na estaca convosco".
E cumpriu com sua palavra, porque confiou no doutor, deixando-o passear sozinho pelos campos, onde se encontrou com o senhor Bradford, que também estava preso a disposição do tribunal real, e que tinha conseguido o mesmo favor de seu guarda. Por sua petição, pus o senhor junto com ele, para ser seu companheiro de cela, e a Comunhão foi ministrada a um grande número de comungantes.
Quando Wyat chegou com seu exército a Southwark, ofereceu libertar todos os protestantes encarcerados, mas o doutor Sands e o resto dos predicadores recusaram aceitar a liberdade sob essas condições.
Depois que o doutor Sands permanecera preso nove meses no cárcere de Marshalsea, foi colocado em liberdade por mediação de Sir Tomás Holcroft, cavalheiro marechal. Embora o senhor Holcroft tinha a ordem da rainha, o bispo tinha-lhe ordenado que não deixasse em liberdade o doutor Sands até ter recebido fiança de dois cavalheiros com ele, obrigando-se cada um deles por 500 libras esterlinas, de que o doutor Sands não se ausentaria do reino sem permissão para isso. O senhor Holcroft se viu de imediato com dois cavalheiros do norte, amigos e primos do doutor Sands, que ofereceram-se a pagar a fiança.
Depois de comer, aquele mesmo dia, Sir Tomás Holcroft mandou que trouxessem o doutor Sands a sua casa de Westminster, para dizê-lhe tudo o que tinha feito, o doutor Sands lhe respondeu: "Dou graças a Deus, que tem movido vosso coração para ter-me tal consideração, pelo que me considero obrigado convosco. Deus vo-lo pagará, e eu mesmo não vos serei ingrato. Mas como me tendes tratado amistosamente, eu também vou ser-vos franco. Vim livremente ao cárcere; não sairei ligado. como não posso ser de benefício algum para meus amigos, tampouco lhes serei para dano. E se sou colocado em liberdade, não permanecerei seis dias neste reino, se posso ir embora. Portanto, se não posso sair livre, enviai-me de novo a Marshalsea, e ali ficareis seguro de mim".
Esta resposta desgostou muito ao senhor Holcroft; mas lhe respondeu como um verdadeiro amigo: "Sendo que não podeis ser mudado de posição, eu mudarei meu propósito, e cederei ante vós. Aconteça o que acontecer, vou deixar-vos em liberdade, e vendo como tendes desejo de atravessar o mar, ide tão rápido como possais. Um coisa vos peço, que enquanto estiverdes lá, não me escrevais nada, pois isso poderia ser minha destruição".
O doutor Sands, despedindo-se afetuosamente dele e de seus outros amigos encarcerados, foi embora. Foi pela casa de Winchester, e dali tomou uma barca e se dirigiu à casa de um amigo em Londres, chamado William Banks, ficando ali por uma noite. Na noite seguinte foi à casa de outro amigo, e ali soube que estava sendo intensamente procurado, por ordem expressa de Gardiner.
O doutor Sands se dirigiu então, de noite, à casa de um homem chamado Berty, um estranho que esteve com ele no cárcere de Marshalsea por um tempo. Era um bom protestante, e vivia em Maik-lane. Ale permaneceu seis dias, e depois foi à casa de um de seus conhecidos em Com-hill. Fez que este conhecido, Quinton, lhe subministrasse dois cavalos, tendo decidido ir-se, nessa manhã, a Essex, a casa de seu sogro, o senhor Sands, onde estava sua mulher, o que executou após ter escapado com dificuldade de ser apresado. Não tinha permanecido ali duas horas antes de ser avisado que dois guardas o arrestariam naquela mesma noite.
Aquela noite o durante Sands foi levado à granja de um honrado camponês, perto do mar, onde permaneceu dois dias e duas noites numa estância, sem companhia alguma. Depois de ter passado pela casa de um tal James Mower, patrão de barco que morava em Milton-Shore, esperou um vento favorável para ir a Flandes. Enquanto estava ali, James Mower lhe trouxe quarenta ou cinqüenta marinheiros, aos que lhes deu uma exortação; tomaram-lhe tanto aprecio, que prometeram morrer antes de permitir que fosse apreendido.
O 6 de maio, domingo, o vento foi favorável. Ao despedir-se de sua hospedeira, que tinha estado casado oito anos sem ter nenhuma criança, lhe deu um bonito lenço e um velho real de ouro, e lhe disse: "Consola-te; antes de ter passado um ano inteiro, Deus te dará um filho, um menino". E isto se cumpriu, porque doze meses menos um diz depois, Deus lhe deu um filho.
Apenas se tinha chegado a Amberes que soube que o rei Felipe tinha dado ordem de ser apreendido. Fugiu então a Augsburgo, em Cleveland, onde o doutor Sands permaneceu quatorze dias, viajando a continuação a Estrasburgo, onde, após ter vivido ali um ano, sua mulher chegou para estar com ele. Esteve doente de um fluxo durante nove meses, e teve um filho que morreu de peste. Sua amante esposa finalmente caiu doente de uma febre, e morreu em seus braços. Quando sua mulher esteve morta, foi a Zurique, e esteve em casa de Peter Martyr por espaço de cinco semanas.
Sentados um dia comendo, lhes levaram de repente a notícia de que a rainha Maria tinha morrido, e o doutor Sands foi chamado por seus amigos em Estrasburgo, onde predicou. O senhor Grindal e ele se dirigiram a Inglaterra, e chegaram a Londres o mesmo dia da coroação da rainha Elizabete. Este fiel servo de Cristo ascendeu, sob a rainha Elizabete, à mais elevada distinção da Igreja, sendo sucessivamente bispo de Worcester, bispo de Londres e arcebispo de York.

O tratamento dispensado pela Rainha Maria a sua irmã, a princesa Elizabete
A preservação da princesa Elizabete pode ser considerada como um exemplo notável do vigilante olhar de Cristo sobre sua Igreja. O fanatismo de Maria não tinha consideração para com os laços de consangüinidade, dos afetos naturais nem da sucessão nacional. Sua mente, fisicamente lenta, estava sob o domínio de homens que não possuíam bondade humana, e cujos princípios estavam sancionados e mandados pelos dogmas idolátricos do romano pontífice. Se tivessem podido prever a curta duração do reinado de Maria, teriam tingido suas mãos com o sangue protestante de Elizabete, e, como sine qua non da salvação da rainha, a teriam obrigado a ceder o reino a algum príncipe católico. A resistência ante tal coisa teria sido acompanhada de todos horrores de uma guerra civil religiosa, e sem teriam sentido na Inglaterra calamidades similares às da França sob Henrique o Grande, a quem a rainha Elizabete ajudou em sua oposição a seus súbditos católicos dominados pelos sacerdotes. Como se a Providência tivesse em vista o estabelecimento perpétuo da fé protestante, deve observar-se a diferença da duração dos dois reinados. Maria poderia ter reinado muitos anos no curso da natureza, porém o curso da graça o dispus de forma distinta. Cinco anos e quatro meses foi o tempo dado a este débil e desgraçado reinado, enquanto que o reinado de Elizabete está entre os mais duradouros de todos que jamais tenha visto o trono inglês: quase nove vezes o de sua desalmada irmã.
Antes que Maria chegasse à coroa, tratou a Elizabete com bondade fraternal, porém desde aquele momento se alterou sua conduta, e se estabeleceu a distância mais imperiosa. Ainda que Elizabete não teve parte alguma da rebelião de Sir Tomás Wyat, foi contudo apreendido e tratada como culpável daquele rebelião. A forma em que teve lugar seu arresto foi semelhante à mente que a havia ditado; os três ministros do gabinete aos que ela designou para que tivessem cuidado do arresto entraram sem nenhuma cortesia em seu dormitório às dez da noite e, ainda estivesse sumamente doente, a duras penas pôde convencê-los para que a deixassem repousar até a manhã seguinte. Seu debilitado estado lhe permitiu ser levada somente em curtas etapas em sua longa viagem a Londres, mas a princesa, ainda que afligida em sua pessoa, teve o consolo que sua irmã jamais poderia comprar: as pessoas pelas quais passava no caminho se compadeciam dela, e oravam por sua preservação.
Ao chegar à corte, foi constituída presa durante duas semanas, estreitamente vigiada, sem saber quem era seu acusador, nem ver a ninguém que pudesse consolá-la ou aconselhá-la. Contudo, a acusação foi finalmente desvelada por Gardiner, que, com dezenove membros do Conselho, a acusou de instigar a conspiração de Wyat, o que ela afirmou religiosamente ser falso. Ao fracassar nisto, apresentaram contra ela seus tratos com Sir Peter Carew no oeste, no qual tampouco tiveram êxito. A rainha interveio agora manifestando que era sua vontade que fosse encerrada na Torre, passo este que abrumou a princesa com o maior temor e inquietude. Em vão abrigou a esperança de que sua majestade a rainha não a enviasse a tal lugar; mas não podia esperar indulgência alguma. O número de seus assistentes foi limitado, e se designaram cem soldados nortistas para guardá-la dia e noite.
O Domingo de Ramos foi levada z Torre. Quando chegou a jardim do palácio, olhou acima para as janelas, esperando ver os da rainha, mas se desenganou. Se deu estrita ordem de que todos fossem à igreja e levassem palmas, para que pudesse ser conduzida a sua prisão sem protestos nem mostras de compaixão.
Ao passar pela Ponte de Londres, a descida da maré fez muito perigosa a travessia, e a barcaça se travou durante um tempo com um espigão da ponte. Para mortificá-la ainda mais, a fizeram desembarcar na Escada dos Traidores. Como chovia intensamente, e se via obrigada a colocar os pés na água para chegar à ribeira, vacilou; mas isso não suscitou nenhuma cortesia no cavalheiro que a atendia. Quando pus seus pés nos degraus, exclamou: "Aqui, embora presa, desembarco como a mais leal súbdita que jamais chegou a estes degraus; e o digo perante Ti, oh, Deus, não tendo outro amigo senão Tu!"
Um grande número de guardas e servos da Torre foram dispostos em ordem, para que a princesa passasse entre eles. Ao perguntar para que era aquela parada, lhe informaram que era o costume. Ela disse: "Se eles estão aqui por mim, rogo-vos que sejam escusados". Ao ouvir isto, os pobres homens se ajoelharam e oraram a Deus que preservasse sua Graça, pelo qual foram expulsos de seus cargos no dia seguinte. Esta trágica cena deve ter sido profundamente interessante: ver uma princesa amável e irrepreensível enviada como um cordeiro, para enlanguescer na expectativa de cruéis tratamentos e morte, e contra a que não havia outros motivos que sua superioridade de virtudes cristãs e capacidades adquiridas. Seus acompanhantes choravam abertamente enquanto ela se dirigia com um andar digno rumo as trágicos merlões de seu destino. "Que quereis dizer-me com estas lágrimas", disse Elizabete; "Vos trouxe para consolar-me, não para desalentar-me; porque minha verdade é tal que ninguém terá motivos para chorar por mim".
O seguinte passo de seus inimigos foi procurar-se evidências por meios que em nossos dias se consideram execráveis. Muitos coitados prisioneiros foram submetidos ao potro do tormento para extrai-lhes, se for possível, qualquer tipo de acusação que pudesse ser susceptível de condená-la a morte, e com isso satisfazer a sanguinária disposição de Gardiner. Ele mesmo foi a interrogá-la, acerca de sua mudança desde sua casa de Ashbridge ao castelo de Dunnington, fazia já muito tempo. A princesa tinha esquecido totalmente este insignificante acontecimento, e lorde Arundel, depois do interrogatório, ajoelhando-se, se escusou por tê-la incomodado numa questão tão trivial. "Me colocais estreitamente a prova", respondeu a princesa, "porém disto estou segura: que Deus tem colocado limite a vossos procedimentos; que Deus vos perdoe a todos".
Seus próprios cavalheiros, que deveriam ter sido seus administradores e tê-la provido das coisas necessárias, foram obrigados a ceder seus postos aos soldados comuns, às ordens do alcaide da Torre, que era em todos os aspectos um servil instrumento de Gardiner; contudo, os amigos de sua Graça obtiveram uma ordem do Conselho que regulou esta mesquinha tirania mais a satisfação dela.
Depois de ter passado um mês inteiro em prisão estrita, enviou uma comunicação ao lorde ajudante de câmara e ao lorde Chandois, aos quais informou do mal estado de sua saúde por falta de ar livre e de exercício. Feita a solicitude ao Conselho, lhe foi permitido, de má vontade, poder passear-se pelas estâncias da rainha, e depois no jardim, momento em que os prisioneiros daquele lado da Torre eram acompanhados pelos seus guardas, que lhes impediam de contemplá-la. Também se excitaram seus ciúmes por um menino de quatro anos, que a diário levava flores à princesa. O menino foi ameaçado com receber açoites, e se ordenou ao pai que o mantivesse afastado das estâncias da princesa.
O dia cinco de maio, o alcaide foi deposto de seu cargo, e Sir Henry Benifield foi designado em seu lugar, acompanhado de cem soldados vestidos de azul, de torva aparência. Esta medida suscitou grande alarme na mente da princesa, que imaginou que estes eram preparativos conducentes a sofrer a mesma sorte que lady Jane Gary e no mesmo corte. Recebendo seguridades de que não havia um tal projeto em andamento, lhe veio à mente o pensamento que o novo alcaide da Torre estava encarregado de acabar com ela secretamente, por quanto seu caráter equívoco harmonizava com a feroz inclinação daqueles pelos que tinha sido designado.
Depois correu o rumor que sua Graça seria levada fora dali pelo alcaide e seus soldados, o que finalmente resultou ser certo. Veio uma ordem do Conselho para que fosse trasladada à casa senhorial Woodstock, o que teve lugar no Domingo de Trindade, 13 de maio, sob a autoridade de Sir Henn Benifield e de Lorde Tame. A causa ostensível de seu traslado foi dar lugar a outros prisioneiros. Richmond foi o primeiro lugar onde se detiveram, e aqui durmiu a princesa, embora não sem muito temor no princípio, porque seus princípios criados foram substituídos pelos soldados, que foram colocados como guardas na porta de sua estância. Pelas queixas apresentadas, lorde Tame anulou este indecoroso abuso de autoridade, e lhe concedeu perfeita segurança enquanto esteve sob sua custódia.
Ao passar por Windsor viu a vários de seus coitados e abatidos servos que esperavam vê-la. "Vai a eles", lhe disse a um de seus assistentes, "e di-lhes de minha parte estas palavras: tanquim ovis, isto é, como ovelha para o matadouro".
Na manhã seguinte, sua Graça se alojou em casa de um homem chamado Dormer, e encaminhando-se a ela, a gente deu tais mostras de leal afeição que Sir Henry se sentiu indignado, e os tratou abertamente de rebeldes e traidores. Em alguns povoados faziam soar os sinos, imaginando que a chegada da princesa entre eles era por causas muito distintas; mas esta inocente demonstração de alegria foi suficiente para que o perseguidor Benifield ordenasse a seus soldados que apreendessem estas humildes pessoas e as colocassem no cepo.
No dia seguinte, sua Graça chegou à casa de lorde Tame, onde permaneceu toda a noite, e foi muito nobremente agasalhada. Isto excitou a indignação de Sir Henry, e o levou a advertir a lorde Tame que considerasse bem sua forma de agir; mas a humanidade de lorde Tame não era das que se deixavam atemorizar, e lhe deu a réplica adequada. Em outra ocasião, este oficial pródigo, para mostrar sua má classe e seu menosprezo pela cortesia, foi a uma estância que tinha sido preparada para sua Graça com uma cadeira, duas almofadas e um tapete, sentando-se ali presunçosamente, e chamando a um de seus homens para que lhe tirassem as botas. Tão logo como o souberam as damas e os cavalheiros da princesa, o ridicularizaram escarnecendo-o. quando acabou a cena, ele chamou o senhor da casa, e ordenou que todos os cavalheiros e as damas fossem para suas casas, assombrando-se muito de que permitisse uma tão grande companhia, considerando o grave encargo que lhe tinha sido encomendado. "Sir Henry", disse sua senhoria, "dai-vos por satisfeito;evitaremos tanta companhia, incluindo a de vossos homens". "não", disse Sir Henry, "senão que meus soldados vigiarão toda a noite". Lorde Tame replicou: "Não há necessidade". "Bom", disse o outro, "haja necessidade ou não, o farão".
No dia seguinte, sua Graça empreendeu viagem dali a Woodstock, onde foi encerrada, como antes na Torre de Londres, guardando-a os soldados dentro e fora das muralhas, cada dia, em número de sessenta; e durante as noites houve quarenta durante todo o tempo de seu encarceramento.
No final lhe foi permitido passear pelos jardins, mas sempre sob as mais severas restrições, guardando as chaves o próprio Sir Henry, guardando-a sempre baixo muitas fechaduras e ferrolhos, o que a induziu a chamá-lo de carcereiro, pelo qual sentiu-se ele ofendido, e lhe rogou que utilizasse a palavra oficial. Depois de muitos rogos do Conselho, obteve permissão para escrever à rainha; mas o carcereiro que lhe trouxe pluma, tinta e papel permaneceu junto dela enquanto escrevia e, ao sair, voltou levar esses artigos até que tornassem a ser necessários. Também insistiu em levar a carta ele mesmo a rainha, mas Elizabete não admitiu que ele fosse o portador, e foi apresentada por um de seus cavalheiros.
Depois da carta, os doutores Owen e Wendy visitaram a princesa, porque seu estado de saúde fazia precisa a assistência médica. Permaneceram com ela cinco ou seis dias, tempo em que ela melhorou muito; quando voltaram à rainha, e falaram aduladoramente da submissão e humildade da princesa, a rainha pareceu comover-se; porém os bispos exigiam uma admissão de que havia ofendido a sua majestade. Elizabete rejeitou esta forma indireta de reconhecer-se culpável. "Se tenho delinqüido", disse ela, "e sou culpada, não peço misericórdia, senão a lei, que estou segura já teria sofrido faz tempo, caso qualquer coisa pudesse ter sido provada em minha contra; desejaria estar igual de livre do perigo de meus inimigos; então não estaria encerrada e cheia de ferrolhos, trás muralhas e portas".
Naquele tempo se falou muito da idoneidade de unir a princesa com algum estrangeiro, para que pudesse ir embora do reino com uma porção apropriada. Um dos do Conselho teve a brutalidade de propor a necessidade de decapitá-la se era que o rei Felipe queria ter o reino em paz; porém os espanhóis, aborrecendo uma idéia tão mesquinha, responderam: "Deus não queira que nosso rei e senhor consinta a tão infame proceder!". Estimulados por um princípio de nobreza, os espanhóis pressionaram desde então o rei no sentido de que seria para maior honra dele liberar a lady Elizabete, e o rei não foi insensível a tal petição. A tirou da prisão, e pouco depois foi enviada a Hampton Court. Se pode observar aqui, de passagem, que a falácia dos arrazoamentos humanos se evidência a cada passo. O bárbaro que propus a ação política de decapitar a Elizabete pouco se esperava a mudança de condição que suas palavras iriam propiciá-lhe. Em sua viagem desde Woodstock, Benifielf a tratou com a mesma dureza que antes, fazendo-a viajar num dia de tempestade, e não permitindo que sua velha criada, que tinha vindo a Colnbrook, onde dormiu uma noite, pudesse falar com ela.
Permaneceu guardada e vigiada durante duas semanas de maneira estrita antes que ninguém ousasse falar com ela; no final, o vil Gardiner acudiu, com três mais do Conselho, com grande submissão. Elizabete o cumprimentou com a observação de que tinha permanecido mantida durante muito tempo em prisão isolada, e lhe rogou que intercedesse diante do rei e da rainha para que a liberassem deste encerro. A visita de Gardiner tinha o propósito de obter da princesa uma confissão de culpabilidade; porém ela se guardou contra suas sutilezas, agregando que antes de admitir ter feito nada errado permaneceria em prisão pelo resto de sua vida. Gardiner voltou a visitá-la, e ajoelhando-se, declarou que a rainha se sentia atônita de que persistisse em afirmar que era sem culpa, só que se inferiria que a rainha tinha encarcerado injustamente sem sua Graça. Gardiner a informou, além disso, de que a rainha tinha declarado que deveria falar de forma diferente antes de poder ser deixada em liberdade. "Então", replicou a nobre Elizabete, "prefiro estar em prisão com honra e verdade antes de ter minha liberdade e estar sob as suspeitas de suas majestade. E me manterei no que tenho falado: não vou mentir!" Então, o bispo e seus amigos partiram, deixando-a encerrada como antes.
Sete dias depois a rainha enviou buscar Elizabete às dez da noite; dois anos tinham-se passado desde que se haviam visto pela última vez. Isso criou terror na mente da princesa, que, ao sair, pediu a seus cavalheiros e damas que orassem por ela, porque não era seguro que pudesse voltar a vê-los.
Conduzida ao dormitório da rainha, ao entrar a princesa se enfeitou, e tendo rogado a Deus que guardasse sua majestade, lhe deu seguranças de que sua majestade não tinha um súbdito mais leal em todo o reino, fossem quais forem os rumores que fizessem circular em sentido contrário. Com um altaneiro desdém, a imperiosa rainha respondeu: "Não vais confessar teu delito, senão que te manténs férrea em tua verdade. Peço a Deus que assim seja".
"Se não for assim", disse Elizabete, "não peço nem favor nem perdão de mãos de vossa majestade". "Bom", disse a rainha, "continuas perseverando teimosa em tua verdade. Além disso, não queres confessar que não foste castigada injustamente".
"Não devo dizê-lo, se assim apraz a vossa majestade".
"Então o dirás a outros", disse a rainha.
"Não, se sua majestade não quer; tenho levado minha carga, e devo levá-la. Rogo humildemente a vossa majestade que tenha boa opinião de mim e me considere sua súbdita, não só desde o começo até agora, senão para sempre, enquanto tenha vida".
Despediram-se sem nenhuma satisfação cordial por parte de nenhuma; e não podemos dizer que a conduta de Elizabete exibisse aquela independência e fortaleza que acompanha à da perfeita inocência. A admissão de Elizabete de que não diria, nem a rainha nem a outros, que tinha sido castigada injustamente, estava em total contradição com o que tinha falado a Gardiner, e deve ter surgido de algum motivo por agora inexplicável. Se supõe que o Rei Felipe estava escondido durante aquela entrevista, e que tinha-se mostrado favorável à princesa.
Após sete dias do regresso da princesa a seu encarceramento, seu severo carcereiro e seus homens foram demitidos, e foi deixada em liberdade, sob a limitação de estar sempre acompanhada e vigiada por algum do Conselho da rainha. Quatro de seus cavalheiros foram enviados à Torre sem outra acusação contra eles que a de terem sido zelosos servos de sua senhora. Este acontecimento foi logo seguido pela feliz notícia da morte de Gardiner, pela que todos os homens bons e clementes glorificaram a Deus, por ter eliminado o principal tigre da guarida, e ter assegurado mais a vida da sucessora protestante de Maria.
Este infame, enquanto a princesa estava encarcerada na Torre, enviou um documento secreto, assinado por alguns do Conselho, ordenando sua execução privada, e se o senhor Bridges, tenente da Torre, tiver sido tão pouco escrupuloso ante um tenebroso assassinato como este ímpio prelado, teria sido morta. Ao não haver assinatura da rainha no documento, o senhor Bridges se dirigiu apressadamente a sua majestade para informá-la e para saber seu parecer. Esta tinha sido uma treta de Gardiner, que tentando demonstrá-la culpável de atividades traiçoeiras tinha feito torturar a vários presos. Também ofereceu grandes sumas em suborno ao senhor Edmund Tremaine e Smithwicke para que acusassem à inocente princesa.
Sua vida esteve várias vezes em perigo. Enquanto estava em Woodstock, se pegou fogo, aparentemente de forma intencionada, entre as vigas e o teto sob o qual dormia. Também corre o intenso rumor de que um tal Paul Penny, guarda de Woodstock, e notório bandido, foi designado para assassiná-la, mas, fosse como for, Deus contrapôs neste ponto os desígnios dos inimigos da Reforma. James Basset tinha sido outro designado para executar a mesma ação; era um peculiar favorito de Gardiner, e tinha chegado a uma milha de Woodstock, querendo falar com Benifield acerca disto. Quis Deus em sua bondade que enquanto Bassey se dirigia a Woodstock, Benifield, por ordem do Conselho, se dirigisse a Londres; devido a isto, deixou ordem firme a seu irmão de que ninguém fosse admitido em presença da princesa.
Quando Elizabete saiu de Woodstock, deixou estas linhas escritas com um diamante na janela: "Muitas suspeitas pode haver, nada demonstrado pode ser. Disse Elizabete, presa".
Ao acabar a vida de Winchester, acabou o extremo perigo filha princesa, porque muitos de seus secretos inimigos pronto o seguiram e, finalmente, sua cruel irmã, que sobreviveu a Gardiner somente três anos.
A morte de Maria tem sido atribuída a várias causas. Os membros do Conselho trataram de consolá-la em seus últimos momentos, pensando que era a ausência de seu marido o que tanto lhe pesava no coração, mas embora isto teve uma certa influência, a verdadeira razão de sua dor era a perda de Calais, a última fortaleza possuída pelos ingleses na França. "Abri meu coração", disse Maria, "quando estiver morta, e achareis ali escrita a palavra Calais". A religião não lhe causava temores; os sacerdotes tinham adormecido nela toda inquietude de consciência que puder ter existido por causa dos espíritos acusadores dos mártires assassinados. Não era o sangue que tinha derramado, senão a perda de uma cidade, o que moveu suas emoções ao morrer, e este último golpe pareceu ser infligido para que suas fanáticas perseguições pudessem ser colocadas em paralelo com sua insensatez política.
Rogamos fervorosamente que nos anais de nenhum país, católico ou pagão, voltem a serem jamais maculados com tal repetição de sacrifícios humanos o poder papal, e que o aborrecimento que se tem contra o caráter de Maria possa ser um faro para os posteriores monarcas, a fim de evitares os arrecifes do fanatismo!

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